Mostrando que, cada vez mais o Brasil sabe menos de futebol, o time dos melhores do campeonato ficou formado por tres jogadores do Corinthians, terceiro colocado; dois do Cruzeiro, vice e dois do Fluminense, campeão. Vasco, Santos, Grêmio e São Paulo completaram o selecionado.
Mais inconveniente do que Andrés Sanchez do Corinthians que tentou ser engraçado, foi o rei da tapioca, Orlando Silva que tentou ser político. Usou o palco iluminado para fazer um discurso mal-disfarçado em prol de sua permanência no Ministério do Esporte.
Boa desculpa: centenário do Corinthians
Sanchez não conseguiu terminar o que mal começara a dizer. Foi defenestrado do pequeno púlpito com uma gentil homenagem da platéia que, aos gritos de "sem ter nada", "sem ter nada", tripudiava o centenário do Corinthians. Foi sutil como um elefante numa sala de cristais. Respondeu que seu time voltou "pela porta da frente". Ele quase saiu pelos fundos do cenário.
A premiação teve dois grandes erros: 1) deu a Conca o troféu de craque do campeonato. Bolas, Neymar só falhou este ano quando demorou para mandar Dorival Júnior para o Atlético de Minas; 2) elegeu Muricy Ramalho, o melhor técnico do Brasileirão - uma injustiça, deveriam ter-lhe dado o premio de melhor do mundo de todos os tempos: fez o Fluminenses ser campeão.
A festa corria com todo mundo jogando pra torcida, quando os caras de pau de pernas curtas entraram em campo e fizeram das coxias do futebol um palanque pornopolítico. Sabe-se lá porque, dessa vez, ninguém conseguiu nem sequer roubar a cena. Nada foi roubado, a não ser a nobreza do esporte, uma vez mais surrupiada.
A pandilha não tem pena. Sem mais o que pegar para justificar a inauguração de uma nova promessa, voltaram ao título do México, em 70 e reuniram quase tudo que restou da Seleção de Ouro em cima do palco. Como a memória brasileira - olá Millôr - "vai só até à Missa de 7° Dia", fingiram que esqueceram Pelé e a Copa de 58, a que escancarou as portas para o penta mundial.
O País do Futebol fez uma festa sem o Rei do Futebol. Sem o Atleta do 2° Milênio. Só o mundo inteiro não entende como isso é possível. A CBF sabe. Talvez seja por isso mesmo que, apesar dos pesares, o Brasil é penta. Talvez seja por isso mesmo que já não é decacampeão.
E lá estavam os campeões de 70, tremulos- muito mais pelo tempo do que pela emoção que os organizadores do evento queriam sugar dos velhos craques para repassar à platéia e aos telespectadores. Pelé não estava. Quem é rei, sempre será majestade. É como dizia o slogan de uma dessas centenas de rádios Cultura: - Quem é bom não se mistura.
Pois foi nesse momento solene que um arauto oficial lançou a pedra fundamental de mais uma proposta: a criação do Fundo de Pensão dos Atletas Profissionais, sob o singelo e sutil sentimento de evitar que eles andem pedindo dinheiro e cadeiras de rodas por aí - "já que a carreira é curta".
Lastimável ver aqueles craques de bola, vestidos de terno e gravata, sapatos apertados sem o conforto das traves nos pés, abraçando políticos de cartola como se fossem gente como a gente. Foi de uma ternura infinda ver João Havelange beijando aqueles senhores todos mais velhos do que ele, transformando-os em comendadores de fitinhas no pescoço. Foi o "bicho" da rodada.
Reprodução/Div.CBF
No fundo, no fundo, Pelé não foi ao regabofe dos cartolas que garantem o pão de cada dia dos descamisados e pés descalços porque sua carreira vai muito bem, obrigado. E, principalmente, porque, embora não pareça, ele é mais supersticioso do que Zagallo. Lula, decerto, iria lhe dar um abraço. Pelé não gosta de viver perigosamente. Não usa band-aid no calcanhar.
Ao fim e ao cabo, a festa serviu para o lançamento oficial da carreira de Ronaldo Fenomeno como cartola de chuteiras. Ainda de chuteiras. Logo elas estarão como coisas comuns dependuradas na sala da diretoria do Corinthians. É corintiano, louco; louco de corintiano. E tem bala na agulha pra chegar a tanto. Mais que um ex-goleador, é um novo mecenas do futebol. Andando com quem anda, ele que se cuide para não sair com uma mão na frente e outra atrás.
Na festa de 2014, quem sabe lá, não será um dos homenageados por Havelange com um beijo e uma comenda no pescoço.